terça-feira, 30 de outubro de 2007

Constituição: manual do usuário

Quando a gente é criança, na escola aprende que a Constituição é a "lei máxima" do país, ou que é a "lei das leis" ou coisa assim. Mas a real extensão da influência dela em nossas vidas é muitas vezes desconhecida. Mais uma vez, é reflexo do péssimo sistema educacional brasileiro, que privilegia conhecimentos totalmente desconexos da realidade do cidadão - que podem até ter sua importância - em detrimento de conceitos básicos de cidadania, direitos, deveres. Pessoalmente penso que o currículo escolar brasileiro deveria ter disciplinas de direito, organização do estado, filosofia e consciência ambiental.

Mas voltemos ao tema deste post: a Constituição. A nossa, que foi escrita "originalmente" em 1988 e "modificada" várias vezes desde então, estabelece as bases de funcionamento do Estado brasileiro (por Estado, com maiúscula, entenda a "máquina do governo"). É a Constituição que estabelece como o Estado brasileiro está organizado (numa federação, ou seja, um conjunto de estados federados: São Paulo, Acre, etc.), como os poderes do Estado estão divididos (poder legislativo para o Congresso Nacional e seus congêneres nos estados federados e municípios, poder executivo para o Presidente, Governadores e Prefeitos, poder judiciário para os tribunais e juízes, poder de reforma da Constituição, etc.).

Uma coisa importante de ser marcada na Constituição é que ela também estabelece os direitos fundamentais do cidadão. Por exemplo, no art. 5º (que, aliás, tem a reputação de ser o "mais longo artigo constitucional do mundo"), estão estabelecidos diversos direitos fundamentais como: igualdade de direitos e obrigações entre homens e mulheres, livre manifestação do pensamento, proibição da tortura, direito de acesso à informação, direito de propriedade, etc... Não daria para me estender muito aqui já que nesse artigo 5º existem 78 incisos e 4 parágrafos.

A Constituição também estabelece o processo legislativo, ou seja, as regras que devem ser atendidas para que outras leis sejam criadas, as regras de cidadania, direitos sociais, direitos políticos, organização dos partidos políticos, competências legislativas dos diversos entes da federação.

Na maioria dos estados constitucionais (que possuem uma constituição), ela é criada com o intuito de evitar a concentração de poderes em uma única figura ou instituição, e também de dar meios jurídicos de um cidadão se defender contra o estado.

Um conceito que parece ser natural, mas na verdade foi estabelecido nos EUA início do séc. XIX quase que acidentalmente foi o de que a Constituição é a lei maior, no sentido de que, se uma outra lei ou ato do governo for conflitante com a Constituição, esta é a que vale.

Isso tem grande importância na vida das pessoas: se alguém (o governo, por exemplo) faz algo contra você que prejudique algum de seus direitos garantidos pela Constituição, você pode alegar a inconstitucionalidade da lei ou medida que baseou o ato da outra parte. Isso dá segurança jurídica à sociedade, pois evita, por exemplo, que uma prefeitura, um governo estadual ou o governo federal saia emitindo medidas arbitrárias, contrárias aos direitos fundamentais garantidos pela Constituição. Existem várias formas por que se pode contestar a constitucionalidade de uma medida governamental, lei ou decisão judicial, como os recursos extraordinários, ações diretas de inconstitucionalidade, etc. Pretendo falar mais sobre eles no futuro.

Algumas curiosidades sobre a Constituição que nem todo mundo conhece:

  • Art 5º, inciso XI: ninguém pode entrar na sua casa (mesmo sendo você inquilino ou posseiro), à noite, exceto nos casos de "flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro". Isso inclui a própria polícia, mesmo com ordem judicial. É claro que, se algum policial quiser entrar na sua casa com objetivos excusos, vai usar algum argumento como o volume da música que você está ouvido, alegando o delito de romper alguma lei municipal do silêncio.
  • Art 5º, inciso XLVII: não haverá penas de morte em tempo de paz, perpétuas, de banimento, de trabalhos forçados ou cruéis. Pelo menos na lei; na prática, as condições carcerárias são desumanas e, portanto, cruéis e por isso inadmissíveis frente à Constituição.
  • Art 5º, inciso LXVII: ninguém pode ser preso por dívidas, exceto por não pagar pensão alimentícia ou por ser depositário infiel (definido, de uma forma simplificada, como aquele a quem se confia a guarda de alguma coisa e não a restitui quando solicitado legalmente);
  • Art 5º, inciso LXXVI: para os pobres, as certidões de nascimento e de óbito devem ser gratuitas.
  • Art 7º: esse artigo define uma série de direitos do trabalhador, como hora-extra maior que a hora de trabalho normal. Há uma conversa toda para se revogar ou flexibilizar a CLT, o que não vai adiantar nada se não houver também um Emenda Constitucional para alterar o art. 7º!
  • Art 13: a língua portuguesa é a língua oficial do Brasil, não o "miguxês" da internet, nem a montanha de termos e citações em inglês das multinacionais e, principalmente, nem o latim que os juristas e às vezes até juízes teimam em incluir em seus pareceres e sentenças, para parecerem mais inteligentes do que são;
  • Art 22, XXVI: compete à União legislar sobre "atividades nucleares de qualquer natureza"... Isso inclui banhos em estâncias de águas radiativas? Parece que tiveram preguiça de especificar "atividades relativas à exploração de equipamentos e processos que utilizam ou exploram a energia proveniente das reações nucleares de materiais radiativos", ou algo parecido;
  • Art. 229: "Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade." - Ou seja, é inconstitucional largar os pais idosos por aí, pobres ou enfermos. Acho um absurdo imaginar que isso precisa estar na lei; mas isso garante que não possam existir leis infra-constitucionais (leis abaixo da Constituição) que contrariem esse importante princípio moral.

Para terminar, um comentário sobre a aplicação dessas regras: uma vez estava conversando com uma amiga sobre essas questões de violência do estado, direitos básicos e etc. Ela ficava muito nervosa quando eu ia mencionando os direitos básicos do cidadão, dizendo algo como: "Que Constituição fantasiosa! Se a Constituição é assim, por que existem crianças com fome, miséria, crimes do colarinho branco, etc. e todos os problemas que conhecemos?"

Porque a Constituição não é a sociedade: ela é a lei que diz como as coisas devem ser, e não como elas são. É um instrumento importante que impede que a opressão seja institucionalizada, que a própria lei legitime os desmandos do governo. É importante que o cidadão saiba que, se há idosos morrendo de frio, se há crianças sofrendo abusos, se há tortura e crueldade por parte do poder público, que isso é ilegal e pode ser combatido na esfera judicial.

Mas, acima de tudo, é importante que as pessoas tenham conhecimento de tais regras, e que tenham a consciência que a Constituição não é a solução dos problemas do país, mas um caminho pelo qual a própria sociedade deve ativamente cobrar posicionamento dos seus representantes para manter as regras gravadas na também chamada Lei Maior. Isso quer dizer que cada um de nós tem a obrigação de ser um "vigia constitucional" do poder público.

Somos responsáveis por nossa omissão. A liberdade é nosso direito, mas tem preço sim. Nas belas palavras de Thomas Jefferson, "O preço da liberdade é a eterna vigilância".

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

"Perdi todos meus primos de primeiro grau..."

- Nossa! O que aconteceu? Desastre?

- Muito pelo contrário: finalmente aprendi direito esse negócio de primeiro e segundo graus...

O diálogo acima é fictício, mas muito importante para ilustrar uma questão que a maioria das pessoas trata de forma imprecisa: o grau de parentesco legal.

Em primeiro lugar, é importante distinguir dois tipos de parentes: os parentes naturais (ou, popularmente, os "parentes de sangue"), e os parentes civis, ou seja, aqueles de quem somos parentes por outros tipos de laços (normalmente por casamento ou adoção).

Para efeitos legais, o grau de parentesco é a medida de "quão próximo/longe é o parentesco", atribuindo um grau de parentesco alto a um parente mais distante. Nessa perspectiva, podemos intuir que, como a relação de paternidade/maternidade é a relação de parentesco mais próxima que se pode ter, ela deve ter o menor grau. Realmente, pais e filhos são parentes de primeiro grau.

Por indução, podemos entender, então, que avós e netos têm grau de parentesco 2: um grau entre o filho e o pai e outro grau entre o pai e o avô. O que me faz lembrar daquele ditado "vó é mãe duas vezes". Ah, essa sabedoria popular.

Continuando, temos, então, o conceito de que o grau de parentesco entre ascendentes/descendentes (também chamados de parentes em linha reta) é dado através da contagem do número de gerações que separam as pessoas em questão: bisavô é parente de terceiro grau, abneto ou trineto é parente de quarto grau, tataraneto é parente em quinto grau, etc.

Um parêntese: talvez valha lembrar a seqüência de parentesco em linha reta na língua portuguesa: pai - avô - bisavô - abávio, ábavo ou trisavô - tataravô ou tetravô.

Agora precisamos entender o parentesco chamado colateral: são os irmãos, tios, primos, etc., que são parentes mas não em linha reta. Para calcular o grau de parentesco entre eles, podemos observar o que diz o art. 1594 do Código Civil de 2002: "Contam-se, na linha reta, os graus de parentesco pelo número de gerações, e, na colateral, também pelo número delas, subindo de um dos parentes até ao ascendente comum, e descendo até encontrar o outro parente."

Ou seja, se pensarmos no primo, filho do irmão do meu pai, chamado popularmente de primeiro grau, devemos subir até o ancestral comum (o avô, por exemplo), e contar o número de passos de mim até o vovô, e depois descer do vovô até meu primo. Teremos a seguinte contagem: papai - vovô - titio - meu primo. Assim, eu e meu primo somos parentes de quarto grau. Isso explica porque aquele que entendeu a regra sai por aí assustando as pessoas dizendo que perdeu todos os primos de primeiro grau: na verdade, nunca os teve.

Vale ressaltar que a lei só reconhece o parentesco colateral até quarto grau. Assim, para fins jurídicos, você não tem nada a ver com o filho de seu primo, ou o filho do primo de seu pai (popularmente chamados de primos de segundo e terceiro graus), que são, legalmente, parentes de quinto e sexto graus.

Essas regras valem para os parentes naturais. E os parentes civis?

O caso mais fácil é o da adoção: de acordo com o CC, art. 1596, os filhos adotivos e os filhos biológicos devem ser tratados da mesma forma, tendo os mesmos direitos. Assim, valem as mesmas regras acima, independentemente de o filho ser natural ou adotivo.

Quanto ao casamento, entende-se que ele cria vínculos de parentesco com relação a ascendentes, descendentes e irmãos do cônjuge ou companheiro (cf. CC art. 1594, §1) . Assim, você é parente por afinidade de seus cunhados e dos ascendentes e descendentes de seu cônjuge (o que quer dizer que pode, sim, chamar de "vovó" a mãe da sua sogra). Mas não há previsão na lei para a "dupla afinidade". Ou seja, não são parentes os concunhados, as consogras, etc.

Um último detalhe interessante sobre o parentesco por afinidade: ele se extingue entre os irmãos, mas não na linha reta com o fim do casamento ou da união estável. Ou seja, quando você se divorcia, ganha uma ex-mulher e um ex-cunhado, mas sua sogra será sempre sua sogra!

Na vida prática, já começa a ser relevante esse conhecimento: por exemplo num daqueles "concursos culturais", se o regulamento disser que não podem participar parentes até o terceiro grau de funcionários do patrocinador, e quem trabalha lá é a esposa do seu cunhado, manda bala: ela não é sua parente (é parente da sua esposa, porém).

O parentesco também interfere em pedidos de alimentos, e impedimento para o casamento (não se pode casar com ex-sogra, por exemplo, já que ela é considerada como sua parente por afinidade de primeiro grau).

Para terminar, um exercício: a imagem abaixo representa uma árvore genealógica: linhas verticais significam ascendência e linhas horizontais significam casamentos (se a imagem estiver difícil de ler, clique nela para abrir numa nova janela). Olhando a imagem, responda às perguntas:


  • Qual o grau de parentesco entre Antonio e Fábio?
  • Qual o grau de parentesco entre Helô e Ivete?
  • Cecília e Elisa são parentes por afinidade?
  • Gustavo e Fábio são parentes por afinidade?
  • Qual o grau de parentesco entre Jair e Gustavo?
  • Ao se separar de Daniel, Cecília poderia se casar com Jair?
  • E se ele também se separar de Ivete, Cecília poderia, então se casar com ele?
Divirta-se com as perguntas e responda-as nos comentários deste post para que possamos discuti-las.

Um abraço!

terça-feira, 23 de outubro de 2007

Pontos sobre a evolução do Código Penal

Já comentei em post anterior que um passatempo que adquiri depois de começar a faculdade de Direito foi o de pegar de vez em quando uma leizinha ou um julgadozinho e dar uma lida. Aliás, como já falei antes da importância de se conhecer a lei, seria bom que todas as pessoas lessem um parágrafo de uma lei todo dia antes de dormir, principalmente da Constituição brasileira que define direitos básicos que nenhuma outra lei pode suprimir (sendo por isso muitas vezes invocada para decisões de recursos).

Uma das leis que mais gosto de ler é o Código Penal (CP), como mencionei no mesmo post. Formalmente, o CP é o decreto-lei 2.848 de 7 de dezembro de 1940. Gosto muito de lê-lo e acho muito interessante sua abrangência. Brinco com meus amigos dizendo que lá tanta coisa é definida como crime que só faltava tipificarem o crime de ir ao banheiro.

O CP já sofreu várias alterações, e é interessante ver que algumas delas refletem claramente mudanças na nossa sociedade. Por exemplo, o artigo 215, que tipifica o crime de posse sexual mediante fraude, antes tinha o texto: "Ter conjunção carnal com mulher honesta, mediante fraude", passou para "Ter conjunção carnal com mulher, mediante fraude" por força da Lei 11.106, de 28 de março de 2005.

Isso já mostra um grande avanço, pois, além dessa expressão "mulher honesta" ser altamente subjetiva (para não dizer também anacrônica, quando usada como sinônimo de mulher casta ou pudica), é um absurdo imaginar que uma mulher promíscua não deva ser protegida desse tipo de crime (além de outros, como o estupro, que teve texto legal alterado de forma similar).

Aliás, repare que conjunção carnal com homem mediante fraude não é o mesmo crime, apesar de que eu imagino que o princípio da livre convicção do juiz talvez possa levar um magistrado a utilizar a analogia (entre a mulher e o homem na qualidade de vítima do crime) como fonte do direito para emitir uma possível condenação de uma mulher que cometer um crime desses contra um homem.

EDITADO: Olha só a bobagem... Mas me perdôo porque ainda sou um calouro de primeiro ano falando sobre disciplinas que ainda não estudou. Não existe analogia no Direito Penal: o juiz só pode considerar crime aquilo que está explícito e detalhado na lei. Ou seja, o homem deve tomar cuidado com a fraude de uma mulher porque ela não cometerá crime se praticar a conjunção carnal com ele, mas o contrário vale.

Uma outra evolução interessante do CP na mesma lei foi a eliminação do crime de adultério. Até a lei que alterou o CP, quem cometesse adultério estaria sujeito a uma pena de 15 dias a 6 meses de prisão. A lei 11.106 revogou o dispositivo correspondente.

Ao me ouvir comentando isso, um colega de trabalho já festejou: "Oba, quer dizer que agora está liberado!" Calma, amigo. Isso só quer dizer que não é mais crime, mas o adultério afeta as condições do processo de divórcio, além de ser possivelmente usado como argumento em um pedido de indenização por danos morais.

Esse comentário do meu colega ilustra bem o quanto a tipificação do adultério como crime estava totalmente defasada com relação aos usos e costumes da atualidade na sociedade brasileira: hoje em dia o adultério não é visto da mesma forma como era visto em 1940. Se, por um lado, a sociedade continua condenando moralmente o adultério (ou a traição em um relacionamento, de uma forma geral), por outro tolera mais a sua prática.

A prática jurídica deve ser assim: doutrinadores e juristas apresentando opiniões e trazendo os temas à discussão, juízes e tribunais decidindo de acordo com a lei e observando as tendências e os valores sociais, legisladores reformando as leis de forma a aproximá-las dos valores considerados importantes para a sociedade, evitando distorções.

Pena que nesse processo haja muita gente defendendo apenas o próprio interesse.

Agradeço a minha esposa Mariana e à profa. Andréa Ueda pela correção.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Assinando um papel em branco

Quando a gente é criança, sempre faz (ou sofre) uma pegadinha clássica. Essa aconteceu no bairro onde eu morava, com o Juquinha, típico moleque levado. Aos 8 ou 9 anos, quando ele já sabia escrever e já entendia o poder da assinatura - provavelmente no dia seguinte ao da aula em que a professora explicou o que é uma assinatura -, na hora do recreio ele diz para seu amiguinho bobinho e ingênuo, o Marquinhos:

- Marquinhos, você já escolheu a sua assinatura?

- Ah, eu já! - responde o outro, todo feliz com a novidade. - Quer ver?

- Claro! - E o Juquinha entrega pro amiguinho um papel em branco e completa, apontando para a parte inferior da folha: - Faz aqui!

O Marquinhos fica todo feliz e escreve o próprio nome, mas dá aquela enfeitada, puxando perninha do "M", fazendo piruetas para escrever o "o" e termina com cinco pinguinhos, um sol e uma casinha. Juquinha então diz:

- Agora deixa eu fazer a minha! - E, com um sorriso maquiavélico, escreve na parte superior da folha: "Devo R$1.000,00 para o Juquinha", e mostra para o enganadinho:

- Ahahah! Agora você vai ter que me pagar!

E o coitado do Marquinhos fica desesperado. Isso quando o Juquinha não fazia esse truque com a Paulinha, com uma declaração do tipo "Eu quero casar com o Juquinha", e ela saía correndo atrás dele, para bater. Claro que uma situação como essa terminava, normalmente, com o papel sendo jogado fora e o Juquinha levando alguma bronca por já ter uma certa malandragem latente despertando.

Acho que tem muita gente que cresce e fica meio traumatizado com essa história. Fica morrendo de medo de contratos em geral, achando que vai encontrar algum Jucão pela vida afora e cair em algum golpe do tipo supracitado.

Brincadeiras à parte, os negócios jurídicos (como são os contratos) sempre foram encarados de uma forma um pouco mais séria pelos legisladores. Desde o Direito Romano, já existe essa visão que o negócio jurídico depende da manifestação de vontade das partes, e que essa manifestação de vontade deve corresponder à "vontade interna" da pessoa. É claro que somente a própria pessoa sabe de sua vontade, então se essa manifestação de vontade não corresponde a sua real intenção, o "mundo exterior" não tem como saber. Nesse caso, vale a vontade manifestada.

No entanto, se a outra parte sabe que a vontade da pessoa não é aquela manifestada, o negócio não se completa. Essa é uma das situações que, genericamente, são chamadas de "defeitos do negócio jurídico".

Podemos observar inicialmente o Art. 110 do Código Civil (CC): "A manifestação de vontade subsiste ainda que o seu autor haja feito a reserva mental de não querer o que manifestou, salvo se dela o destinatário tinha conhecimento."

Aqui se encaixa a situação em que um ator, em uma peça de teatro, entrega um relógio de pulso para o outro ator e diz: "fique com esse relógio, não preciso mais dele". Em termos formais, enquadra-se na doação verbal prevista no parágrafo único do Art. 541. do CC: "A doação verbal será válida, se, versando sobre bens móveis e de pequeno valor, se lhe seguir incontinenti a tradição." (tradição, aqui, no sentido de entrega).

Ora, o ator que recebe o relógio sabe que o outro não quer realmente lhe dar o relógio, só está representando. Sabe que sua vontade "interior" não corresponde àquela que foi manifestada. Assim, o negócio de doação não terá validade, mesmo se o donatário quiser dar uma de espertinho e levar a questão à justiça , inclusive alegando ter muitas testemunhas (a platéia).

Quanto à situação do papel assinado em branco, e depois preenchido com um contrato desfavorável na parte de cima do papel, temos várias normas que protegem, em tese, a vítima do golpe. Além da citada anteriormente, temos também, por exemplo, o Art. 422 do CC:"Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé."

É claro que tudo isso depende de se provar, no âmbito judicial, que houve a má-fé, e até mesmo que o contrato foi assinado em branco. É por isso que a maioria dos contratos exige assinatura de testemunhas que podem ser ouvidas em um processo para que se determine que houve realmente a fraude. Certos negócios exigem até mesmo o registro do contrato em cartórios, com firma reconhecida na presença do signatário, para evitar fraudes.

Portanto, é sempre bom evitar assinar papéis em branco ou documentos incompletos, mas não é preciso se desesperar: ainda seria necessário que o golpista entrasse na justiça, de má-fé, para produzir uma prova falsa (falsos testemunhos, por exemplo) alegando que você, na verdade, realmente tinha a vontade manifestada no tal contrato.

Para terminar, um comentário sobre as crianças mencionadas no começo deste artigo: a Paulinha provavelmente saiu correndo atrás do Juquinha para bater porque ela realmente gostava dele. Isso quer dizer que a manifestação correspondia à vontade dela de se casar com ele, mas que ela apenas tinha vergonha de dizer, bem diferente do Zezinho que não queria realmente dar os mil reais. Será que isso fez com que o casamento da Paulinha com o Juquinha seja válido?

Claro que não. Além de toda essa discussão sobre a manifestação de vontade, o negócio jurídico depende da capacidade jurídica das partes. Menores de dezesseis anos são considerados absolutamente incapazes, não podendo, portanto, contrair matrimônio. Além disso, o casamento não se celebra com um reles contrato entre as partes, ele tem uma série de exigências de forma, que serão abordadas neste blog, em um próximo post.

Agradeço à Profa. Andréa Ueda pela revisão.
Agradeço a Rafael Dourado pela ilustração.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

O XI de Agosto é nosso?

Sendo atualmente estudante de Direito, não posso deixar de mencionar a comemoração da criação dos cursos jurídicos no Brasil, neste post curto de hoje.

Os primeiros cursos jurídicos instalados no país foram criados pela Lei Imperial de 11 de agosto de 1.827, estabelecendo a instalação de cursos de Direito em São Paulo e em Olinda. Faz bastante sentido, uma vez que o Brasil mantinha ainda uma certa polaridade política norte-sul, advinda da tradição nordestina em contraponto com o crescente poder econômico do sudeste.

É muito interessante ler o texto da lei na íntegra, disponível na base de dados de legislação brasileira, acessível a partir do site de legislação (que já comentei em um post anterior). A lei, que consta do site com grafia original, pode ser lida clicando aqui. Ela descreve até mesmo a idade mínima para cursar Direito ("quinze annos completos") e as matérias das provas de admissão ("Lingua Franceza, Grammatica Latina, Rhetorica, Philosophia Racional e Moral, e Geometria"), além dos salários dos lentes e secretários.

Até então, os poucos privilegiados que dispunham de recursos iam estudar Direito na Europa; tanto que vários alunos das primeiras turmas formadas na Faculdade de Direito da USP, conforme o banco de dados do site da Associação dos Antigos Alunos, indica que muitos dos formandos eram transferidos de Coimbra.

Com os cursos no Brasil, um importante passo na formação dos quadros políticos e jurídicos do Estado brasileiro foi dado: sendo o Direito a arma nos embates, inclusive contra o governo, em um Estado Democrático de Direito, os cursos foram fundamentais para entregar mais poder ao povo para se defender do próprio Estado.

Ressalto a importância de se perceber os dois cursos criados como de igual valor (na lei não é feita nenhuma distinção especial entre São Paulo e Olinda) e, acima de tudo, simultâneos, dado que surgiram com a mesma lei. O "XI de Agosto" é tão paulista quanto pernambucano, apesar de haver uma certa "apropriação" da data pela comunidade do Largo São Francisco: basta olhar a exposição "180 Anos da Criação dos Cursos Jurídicos no Brasil", atualmente no Palácio da Justiça na Praça da Sé, em São Paulo. Apesar do título, a exposição aborda basicamente a escola de São Paulo.

Em um texto muito ilustrativo do senador Marco Maciel, publicado no jornal "O Estado de São Paulo" e reproduzido no site Consultor Jurídico (leia o texto clicando aqui), é feita uma revisão histórica da criação dos dois cursos, ressaltando inclusive um fato que aproxima mais ainda as duas escolas: a prática de vários alunos (alguns hoje ilustres) de iniciar o curso em uma escola e terminar na outra, como o Barão do Rio Branco, que começou em São Paulo e concluiu em Pernambuco, e Rui Barbosa, que começou em Pernambuco e terminou em São Paulo.

Estive na exposição ontem na hora do almoço; é muito bacana (e o prédio também é lindo, eu ainda não o conhecia), apesar, como disse, dessa "parcialidade". Não lembro de ter visto muita coisa sobre Pernambuco - se é que tinha -, mas admito que vi a exposição muito rapidamente.

Em resumo: o 11 de agosto é nosso, mas não é só nosso: é deles também.

Se você foi na exposição, deixe um comentário com sua opinião!

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Sobre roubo e furto

Ao final do post de ontem, comentei a respeito do Código Penal, e com isso acabei me lembrando de minha aula (ainda em Direito Romano) sobre os delitos, em especial sobre furto e roubo.

A diferença entre ambos, informalmente, é nenhuma. O dicionário Houaiss, como primeiro significado de furto, coloca lá, categoricamente: roubo. Mas a lei (e isso desde os romanos) os define diferente:

Furto: "Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel.", conforme o art. 155 do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940).

Roubo: "Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência.", conforme o art. 157 do Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940).

Pela simples leitura dos dois artigos, já conseguimos extrair algumas informações interessantes:

  • Tanto faz se for roubo ou furto: o objeto tem que ser uma coisa móvel. Assim, é errado dizer "roubaram aquela casa" (porque a coisa tem que ser móvel) ou mesmo "fui roubado" (porque o objeto é uma coisa e não uma pessoa).

  • O roubo distingue-se do furto, essencialmente, pelo uso, pelo criminoso, de "grave ameaça ou violência à pessoa". Observamos aí, em primeiro lugar, que não precisa haver violência, basta haver grave ameaça. Me pergunto se a jurisprudência ou a doutrina já pacificaram o que é "grave" na expressão; se o bandido me diz "o relógio ou a vida" apenas, mas claramente não está armado, seria grave a ameaça? Ou ainda, se ele me diz "passa o relógio ou eu digo para todo mundo que você gosta de música sertaneja", isso pode ser ameaça grave, se minha reputação depender disso? É claro (e acabo de ler um acórdão do TJSP sobre roubo) que apontar uma arma é grave ameaça, mas os casos limítrofes ainda ficam na dúvida...

  • "ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência." é também bem interessante. Quer dizer que o golpe "Boa noite, Cinderela" (quando alguém é dopado e depois tem seus bens subtraídos) é considerado roubo e não furto.

E qual a importância de se identificar, claramente, se um crime é roubo ou é furto?

Muito simples: a pena básica de roubo é de quatro a dez anos mais multa, e a de furto é de um a quatro anos, mais multa. É óbvio que um "roubante" vai tentar ao máximo criar argumentos que minimizem a gravidade da ameaça, mostrem que a violência empregada foi legítima defesa ou que a vítima tinha, sim, possibilidade de resistir ao roubo, para se configurar como "furtante". E é óbvio que o Ministério Público vai tentar derrubar tais argumentos.

Também é interessante prestar atenção ao § 2º do art. 155 do CP: "Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa."

Essa possibilidade só existe no furto, e não no roubo. Isso explica o porquê daquele caso, há alguns anos, em que uma mulher "subtraiu" uma manteiga de uma padaria e foi presa e condenada, se não me engano, a uns quatro anos. Lembro inclusive de ter lido isso: o juiz entendeu que ela havia feito a tal "grave ameaça" e, portanto, o que ocorrera havia sido roubo e não furto, não havendo a possibilidade de liberação dela mesmo pelo valor da manteiga ter sido baixo.

Um último comentário bastante pertinente foi do Prof. Dárcio Rodrigues, em aula de Direito Romano, a respeito da confusão comum entre furto e roubo: esses novos alarmes de veículo, que além de uma sirene ensurdecedora, também têm uma voz berrando: "Atenção! Este carro está sendo roubado! Por favor, ligue para a empresa tal". Como o bandido não ameçou nem usou da violência para levar o carro (muito pelo contrário, se o carro estava com o alarme ligado, é porque o dono estava até longe), o que acontecia ali é furto, e não roubo.

Diz o coitado do Prof. que até lhe "dói os ouvidos" ouvir tamanha imprecisão jurídica.

Agradeço a Rafael Dourado pela ilustração.

terça-feira, 16 de outubro de 2007

Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece

O título deste post é o texto do art. 3º do Decreto-Lei nº 4.657, de 1942, também conhecido como "Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro".

O texto estabelece um princípio segundo o qual as pessoas têm a obrigação de conhecer as leis, pois ninguém poderá usar o desconhecimento da lei como desculpa. Por sinal, é um princípio geral do Direito, ou seja, seria aplicado mesmo que não fosse explícito.

É claro, até mesmo para os juristas, que esse princípio é pura ficção jurídica. Sabe-se que ninguém, nem o mais dedicado juiz ou professor de Direito, vai conhecer todas as leis, a todo momento, de cabeça. Essa presunção existe para garantir um mínimo de estabilidade social.

Se alguém pudesse alegar que desrespeitou uma lei porque não a conhecia, seria o caos. Afinal, como provar que alguém conhece uma lei? Teríamos "comprovantes de leitura" assinado por todos? E isso garantiria que a pessoa conheceria a lei? E quem não soubesse ler? Aliás, isso seria um ótimo motivo para não aprender a ler: o sujeito não teria que obedecer lei alguma. E imagine um assassino sendo absolvido porque não conhecia a lei que proíbe de matar...

Assim, todo cidadão tem a obrigação de conhecer todas as leis. É claro que vamos acabar conhecendo apenas as principais, em especial as que regulam nosso dia-a-dia, vamos tentar conhecer os princípios e a lógica que produz as demais e torcer para não fazer nada errado.

Decorre daí que é mais importante ainda a necessidade do Estado de dar acesso à educação para todos. O cidadão teria que ter condições de acompanhar a publicação de novas leis, e também de pesquisar as leis atualmente vigentes.

A imprensa oficial é o órgão que publica as leis, no Diário Oficial da União (para leis federais; existem órgãos equivalentes nos níveis estadual, distrital e municipal). O cidadão teria que estudar as leis já vigentes, pesquisando os DOUs passados, em que foram publicadas, tomando o cuidado também de acompanhar as leis que alteram outras leis, ou as revogam. E a partir daí, teria que ler todos os dias para garantir que novas leis não passariam desapercebidas.

O DOU é a fonte oficial de acesso às leis, mas é muito cansativo (para não dizer chato mesmo) de ler. Se o objetivo é pesquisar leis, eu sugiro começar pelo site do Palácio do Planalto (http://www.presidencia.gov.br/). Lá, existe um link legislação, que contém uma grande compilação de leis, decretos, constituição (federal e estaduais), etc.

As leis são disponibilizadas já compiladas, ou seja, com o texto atualmente em vigor (resultante da publicação original da lei, mais as publicações de leis que a alteram). São indicadas as leis que alteraram ou revogaram partes de cada lei. Eles alertam que o texto lá não pode ser considerado oficial, podendo estar desatualizado. Mas isso é um alerta para evitar que alguém se baseie cegamente no texto e alegue que foi porque leu no site da presidência. Mesmo assim, o site até que é bem atualizado.

Realmente, uma iniciativa muito boa e útil para os cidadãos. Eu mesmo gosto de, de vez em quando, me distrair lendo o Código Penal. É muito divertido, porque você vê que muitas coisas que são consideradas aceitáveis hoje em dia são ou foram consideradas crimes (como o adultério, que só deixou de ser crime em 2005), além de ver o texto revogado de multas de valor estabelecido em contos de réis.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

De dia é Maria, de noite é Joana

Muita gente já ouviu falar de histórias a respeito de pessoas que mudam ou tentam mudar de nome. Entre as mais conhecidas, estão a de Roberta Close, nascida homem com nome de Roberto, tentou mudar de nome (e sexo) no registro civil após cirurgia feita no exterior.

Também é conhecida a história da filha de Baby Consuelo e Pepeu Gomes, Riroca, que mudou o nome para Sara Sheeva. Além, é claro, do presidente Luis Inácio da Silva, que colocou um Lula no meio de seu nome, por questões eleitorais, e de Maria da Graça Meneghel, que colocou um Xuxa por ser o nome artístico com que é mais conhecida.

Também é de razoável conhecimento das pessoas que todos têm o direito de solicitar ao poder judiciário a mudança de nome. As regras que detalham esse direito estão definidas na Lei 6.015, de 1973, também conhecida como LRP (Lei dos Registros Públicos).

A solicitação de mudança de nome deve ser "motivada" (ou seja, o solicitante precisa dizer o motivo pelo qual isso é feito) e "por exceção" (ou seja, só em casos excepcionais). Normalmente, o juiz vai levar em conta coisas como se o nome solicitado é o nome pelo qual a pessoa é mais conhecida, se o nome não a expõe ao ridículo, etc. Vale lembrar que o parágrafo único do art. 55 da LRP obriga o oficial de registro civil a não registrar um nome de criança que possa expô-la ao ridículo, mas os pais podem solicitar a apreciação do juiz no caso.

Ou seja, essas mudanças de nome são sempre sujeitas à apreciação de um juiz, que pensa no interesse e na dignidade da pessoa por um lado, e por outro lado na dificuldade de identificar uma pessoa. Se todos mudassem de nome o tempo todo, seria muito difícil, por exemplo, identificar um devedor fujão.

Agora, o que pouca gente sabe é que o art. 56 da mesma LRP diz o seguinte:
"O interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa."

Isso quer dizer o seguinte: atingida a maioridade civil (que normalmente é quando a pessoa faz 18 anos, mas existem outros casos como emancipação), a pessoa pode mudar livremente, sem precisar de autorização judicial, seu nome, desde que não afete os sobrenomes de família. Esse direito, no entanto, só vale por um ano. Depois disso, só com a autorização judicial como nos casos acima.
Por exemplo, José da Silva poderia mudar seu nome para João da Silva, Maria da Silva ou Geladeira da Silva (sempre mantendo o da Silva). Alfredo Antunes Andrade poderia mudar o nome para Alfredo Andrade Antunes, Antunes Alfredo Andrade ou Sálvio Antunes Mátio Andrade.

E o caso mais escabroso: Bernardo Borges Sobrinho poderia mudar seu nome para Carlos Costa, se Borges não for o nome de família (por exemplo, Bernardo Borges poderia ser tio por casamento - por ter se casado com a irmã da mãe de Bernardinho, por exemplo).

Claro que essas especulações ficam por conta da vagueza, na lei, da definição dessas regras. Por exemplo, "apelidos de família" pode ser interpretado como nomes apenas dos pais, ou como nome dos parentes por casamento também - nesse caso, a mudança do Bernardo acima seria vetada.

Também vale ressaltar que o tal art. 55 citado acima fala do registro de nascimento, mas se o seu parágrafo único for aplicado, a mudança para Geladeira da Silva, ou para Sálvio Antunes Mátio Andrade seria vetada (ainda mais se alguém ler em voz alta esse nome!).

Acho que tem todo um sentido essa regra de poder mudar de nome. O nome que temos quando criança foram nossos pais que escolheram. Mas quando entramos na vida adulta, temos o direito de mantê-lo se assim o desejarmos, como homenagem à tal escolha, ou de abandoná-lo, se quisermos uma ruptura com esses laços. O nome acabaria sendo um elemento a mais do rito de passagem para a vida adulta na nossa sociedade. E o prazo de um ano limita esse direito a um período curto, durante o qual o sujeito teria realizado "poucos" negócios jurídicos que pudessem ser prejudicados porque a identificação poderia mudar.

Eu mesmo adoraria ter conhecido essa lei quando atingi a maioridade. Teria colocado um Antonio do meu avô junto do meu nome, como homenagem.

Ilustrações por cortesia de Rafael Dourado.

quarta-feira, 10 de outubro de 2007

MP a serviço, também, da educação

A linguagem do Direito deveria ser acessível a todo cidadão. Afinal, em um litígio qualquer, é o interesse do próprio réu ou autor que está em jogo, e não (diretamente) o interesse do promotor, juiz ou advogado.

Não me agrada nada esse conceito de que o Direito fica na mão e é controlado por uns poucos privilegiados; essa história de "falar difícil" e abusar de expressões em latim é coisa de enganador (que não quer dar acesso ao leigo à essência da argumentação de sua mensagem) ou de mal-intencionado (que quer ter poder sobre o leigo ao tornar-lhe os instrumentos de Direito inacessíveis).

Nesse sentido, é bastante louvável a iniciativa de certas instituições de disseminar o conhecimento jurídico para a população em geral.

Destaco o Glossário de termos jurídicos do site do MPF (Ministério Público Federal).

http://noticias.pgr.mpf.gov.br/servicos/glossario

Seria um bom ponto de partida para conhecer termos júridicos.

terça-feira, 9 de outubro de 2007

"Ex tunc" e "ex nunc"

Essa é uma das confusões mais comuns do estudante de Direito, do concurseiro e também do cidadão que se depara com uma sentença (para os estudantes de Direito mencionados na revista Veja de 30/09: sentença é aquele papel que contém a decisão final de um juiz, e não uma opinião sobre algum tema emitida por um especialista: isso é parecer).

Afinal de contas, quando é ex tunc e quando é ex nunc?

A explicação acadêmica é simples: ex tunc, que significa em latim "desde então", significa que determinada decisão, sobre fato no passado, possui efeitos "desde a data do fato no passado". Já ex nunc, que significa em latim "a partir de agora", significa que os efeitos da decisão não valem desde a data de ocorrência do fato discutido, mas apenas a partir da data da decisão.

Ou seja, se o juiz decidir hoje que a venda de uma casa, que foi feita em 2000, deve ser considerada anulada, com efeitos ex tunc, significa que a venda deve ser considerada desfeita desde 2000. Mas se a sentença indicar efeitos ex nunc, a venda deve ser considerada feita em 2000, mas deve ser desfeita a partir da data da decisão. Isso afeta diretamente os juros que incidirem sobre uma indenização, por exemplo.

Os estudantes, quando começam a estudar algum assunto, já tendem a criar "fórmulas mnemônicas" (como diz o Prof. Dárcio Rodrigues) para facilitar a memorização. A mais interessante, na minha opinião, sobre ex tunc/ex nunc é a seguinte: associe "tunc" com testa e "nunc" com nuca (começam com a mesma letra). Se você levar um tapa na nuca, sua cabeça vai para frente => ex nunc tem efeitos daqui para frente. Mas se você levar um tapa na testa, sua cabeça vai para trás => ex tunc tem efeitos para trás, atingindo desde a época do fato discutido.


Imagem cortesia de Rafael Dourado.

Se você tiver sua própria opinião sobre a distinção ex tunc/ex nunc, ou se conhece uma fórmula mnemônica interessante, deixe um comentário!

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Sobre este blog

Bem vindo(a) ao Direito Diário.

Este é um blog pessoal, de autoria de um aluno de Direito, que tem por objetivo apresentar um pouco de minhas experiências e aprendizados na jornada por esse mundo interessante e desafiador chamado ciência jurídica.

Aqui pretendo apresentar, ao público em geral, discussões curtas sobre conceitos simples de Direito, na forma de dicas ou de pequenas doses, vindas de percepções próprias ou diretamente da lei, doutrina, jurisprudência ou das discussões na faculdade. Também espero que essas discussões possam gerar comentários de colegas - tanto estudantes, como professores, monitores e juristas em geral.

Pretendo publicar uma dica por dia útil. Fique à vontade para comentar sempre que quiser, principalmente apontando meus erros, mas também acrescentado dados às discussões publicadas. Ou simplesmente aproveite os textos.

ATENÇÃO: As informações neste site são de caráter meramente educativo, sendo o leitor orientado a procurar um advogado para conselho legal cabível. Não utilize este site como fonte de informação para ações ou negócios jurídicos. Não me responsabilizo por eventuais danos legais, morais, materiais, físicos, emocionais, mentais ou espirituais ocasionados pelo uso das informações aqui divulgadas.

Até breve!