quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

O preço do presentinho na bagagem


Olá a todos. Em primeiro lugar, peço desculpas pelo grande tempo entre as atualizações... O Direito Diário também tirou férias. Isso foi devido ao fim de ano tanto no trabalho como na faculdade. Com a volta às aulas e um novo planejamento, pretendo realizar atualizações a cada quatro dias. Vamos torcer para isso dar certo!


Aproveito, então, esse pretexto das férias para falar neste post sobre um assunto que muita gente me pergunta: a questão das mercadorias que a gente traz do exterior quando viaja. Vou me ater à questão da bagagem acompanhada, que é aquela que vem com você no avião (mesmo que despachada), diferente da bagagem desacompanhada, que, de uma forma simplificada, é aquela que você manda por remessa ou encomenda, em separado da sua viagem.


Chamamos de importação a entrada de mercadoria estrangeira no território brasileiro. Por estrangeira, entende-se tanto a mercadoria fabricada no exterior, como a brasileira que tenha saído do Brasil pelo processo inverso de exportação e que esteja retornando. Pode parecer simples essa regra, mas ela é cheia de exceções. Por exemplo, se a mercadoria é brasileira, foi exportada mas está sendo devolvida por defeito de fabricação, ela não é considerada estrangeira quando entra de novo no Brasil e, portanto, isso não é tratado como importação.


Mas no nosso caso, interessa simplesmente a bagagem de um viajante. E essa não constitui exceção: se você trouxer qualquer quantidade de mercadorias do exterior, que seja um único pirulito, lolipop, Lutscher ou sucette, será sempre considerada mercadoria estrangeira. E, de acordo com o Regulamento Aduaneiro (Decreto 4.543, de 26 de dezembro de 2002), no art. 69, "o imposto de importação incide sobre a mercadoria estrangeira... inclusive sobre bagagem de viajante".


Também no RA, art. 72, "o fato gerador do imposto de importação é a entrada de mercadoria estrangeira no território aduaneiro". Ou seja, no momento em que a mercadoria estrangeira entra no Brasil, o imposto passa a ser devido.


Agora vem a parte boa: à bagagem de viajante é concedido um limite de isenção de imposto, a popular "cota", cujo valor varia de acordo com o meio de transporte do viajante. Para quem chega ao Brasil pelo ar ou pelo mar, o limite é de 500 dólares, mas para quem chega por terra, rio ou lago, o limite é de 300 dólares.


Cabe ressaltar que o termo "cota" muitas vezes é empregado de forma errada: "cota de importação" é errado, seria correto se você fosse proibido de trazer mais do que um determinado valor, sendo obrigado a deixar as mercardorias que excedessem na entrada do país. O nome correto da cota é cota de isenção de imposto de importação.


No caso, e aqui é a segunda parte (relativamente) boa: se você trouxer mais do que 500 dólares (ou 300, conforme o caso) em mercadorias, os primeiros 500 dólares são isentos de imposto, e sobre o restante incide apenas o imposto de importação, à alíquota de 50%.


Essa cota de isenção se refere a mercadorias em geral (os presentinhos para a família caem nesse grupo). São isentos também, independentemente do valor, e contados "por fora" do limite de isenção, livros, revistas, jornais, roupas e materiais de consumo próprios do viajante (ou seja, não adianta a tia tentar dizer que aquele par sapatos sociais masculinos tamanho 44 são dela!).


Outra coisa interessante é que, além desse limite de 500 dólares, também são isentos mais 500 dólares que forem gastos no free-shop (ou duty-free ou loja franca) apenas na entrada do país. Ou seja, se você comprar 300 dólares nos EUA, e na chegada ao Brasil comprar mais 500 dólares no free-shop, não deve nada de imposto. Mas se comprar 500 dólares no free-shop ao sair do Brasil, e mais 300 nos EUA, todos esses 800 dólares contam na cota de bagagem e, portanto, você deverá pagar 50% sobre o excedente (800 - 500 = 300, e portanto o imposto é de 150 dólares).


Em adição a isso, é importante salientar que não é qualquer coisa que é entendida como bagagem, mesmo que venha dentro da mala ou no avião com a pessoa. A principal exclusão do conceito é de mercadorias para revenda ou industrialização. Uma peça de um torno industrial não é bagagem, como também não é bagagem uma mala com quinhentos pares de meia.


Finalmente, vale destacar que existem mercadorias que não podem ser trazidas para o Brasil em hipótese alguma, e outras que podem ser trazidas somente mediante autorização. Entre os exemplos:



  • Produtos piratas ou contrafeitos (tênis Nike falsificado ou CD com Windows pirateado, por exemplo)

  • Armas ou réplicas (mesmo de brinquedo, precisam de autorização do Exército)

  • Animais (precisam de autorização do Ministério do Meio Ambiente ou do Ibama)

  • Cigarros de marca que não seja comercializada no país de origem

  • Cigarros ou bebidas brasileiras destinados ao consumo no exterior

Uma ressalva que alguém poderia fazer é que o fato de se pagar 50% de imposto de importação não é um ponto positivo, mas negativo. A idéia do legislador é criar um mecanismo pelo qual a importação fica mais simples e menos burocrática, mas mais cara, para desestimular a adoção desse mecanismo, que tem menos controle.


É porque a alternativa é você fazer o chamado despacho de importação, que é um procedimento mais complicado (e possivelmente mais caro, se você precisar de um despachante para isso!), para trazer a mercadoria para o Brasil. No despacho aduaneiro geral, na mercadoria incide II (imposto de importação), IPI, ICMS, PIS e COFINS, e esses impostos incidem sobre o valor da mercadoria mais o frete e seguro, se houver. O IPI, II e ICMS têm alíquotas que dependem do tipo de mercadoria, por isso pode ser menor o valor total do imposto.


Para quadros com pinturas artísticas, por exemplo, a alíquota total (somando todos os impostos, considerando ICMS de 18%) no despacho normal de importação é de 31,25%, o que é vantagem com relação ao tratamento simplificado de bagagem. Mas para lixos municipais (sim, você paga impostos se quiser importar lixo - mas não se esqueça de pedir autorizações da ANVISA e de outros órgãos competentes), a alíquota total é de cerca de 44,74%.


Assim, a conclusão é que, na maioria dos casos, o viajante não paga nada para trazer presentinhos para a família, ou paga pouco (supondo que nesses casos, os presentinhos vão totalizar no máximo 500 dólares no exterior e 500 dólares no free-shop de entrada). Ao valor excedente corresponde imposto simplificado de 50% - ou seja, só precisa pagar esse imposto e mais nada!


Lembro também que é obrigação do viajante declarar à aduana caso suas mercadorias totalizem mais do que a cota de isenção. Assim, se você trouxer mais que 500 dólares em via aérea, deve escolher, ao entrar no Brasil, a fila "bens a declarar" (nessa fila, as autoridades irão orientar sobre como pagar o imposto). A outra fila, "nada a declarar", corresponde às pessoas que estão trazendo menos do que 500 dólares. É claro que se uma pessoa entrar com, digamos, 700 dólares e quiser sonegar o imposto de importação (que, no caso, seria de 100 dólares), ela vai pegar a fila "nada a declarar".


É por isso que a Receita Federal seleciona algumas pessoas da fila "nada a declarar" para serem objeto de fiscalização: quem é selecionado recebe a famosa "luz vermelha" e os demais, a também famosa "luz verde". Se a pessoa for pega declarando incorretamente ou deixando de declarar(seja por má-fé ou por distração), deve pagar, além do imposto, uma multa de igual valor (no nosso exemplo, o sujeito pagaria outros 100 dólares de multa).


Acredito que isso gere a confusão comum de que "o imposto de importação para bagagem é de 100%". Com o que vimos acima, já sabemos que o imposto (sempre sobre o que exceder a cota de isenção) é de 50%; os outros 50% são multa por declaração incorreta ou por não-declaração.


Reforço que se você passa com mercadorias pelas quais deveria pagar imposto pela fila "nada a declarar", e não for selecionado para fiscalização pela Receita Federal, isso não quer dizer que o imposto foi perdoado: quer dizer que você sonegou imposto e não foi descoberto. A mercadoria é tão ilegal quanto aquelas que chegam por caminhos escusos.


E a entrada no país não é uma grande barreira que, transposta, indica que seus problemas acabaram: é possível que você seja abordado por um fiscal em um bloqueio em estrada, por exemplo, e se para aquele notebook de 800 dólares que seu amigo trouxe de Miami você não tiver nota fiscal, nem comprovante de pagamento de imposto de importação, pode acontecer inclusive de você perder a mercadoria.


Espero ter sido claro neste texto, mas fique à vontade para postar comentários no blog inclusive com dúvidas que ainda tenham ficado, ou com sua opinião a respeito deste texto. Um abraço e até a próxima!