quinta-feira, 25 de outubro de 2007

"Perdi todos meus primos de primeiro grau..."

- Nossa! O que aconteceu? Desastre?

- Muito pelo contrário: finalmente aprendi direito esse negócio de primeiro e segundo graus...

O diálogo acima é fictício, mas muito importante para ilustrar uma questão que a maioria das pessoas trata de forma imprecisa: o grau de parentesco legal.

Em primeiro lugar, é importante distinguir dois tipos de parentes: os parentes naturais (ou, popularmente, os "parentes de sangue"), e os parentes civis, ou seja, aqueles de quem somos parentes por outros tipos de laços (normalmente por casamento ou adoção).

Para efeitos legais, o grau de parentesco é a medida de "quão próximo/longe é o parentesco", atribuindo um grau de parentesco alto a um parente mais distante. Nessa perspectiva, podemos intuir que, como a relação de paternidade/maternidade é a relação de parentesco mais próxima que se pode ter, ela deve ter o menor grau. Realmente, pais e filhos são parentes de primeiro grau.

Por indução, podemos entender, então, que avós e netos têm grau de parentesco 2: um grau entre o filho e o pai e outro grau entre o pai e o avô. O que me faz lembrar daquele ditado "vó é mãe duas vezes". Ah, essa sabedoria popular.

Continuando, temos, então, o conceito de que o grau de parentesco entre ascendentes/descendentes (também chamados de parentes em linha reta) é dado através da contagem do número de gerações que separam as pessoas em questão: bisavô é parente de terceiro grau, abneto ou trineto é parente de quarto grau, tataraneto é parente em quinto grau, etc.

Um parêntese: talvez valha lembrar a seqüência de parentesco em linha reta na língua portuguesa: pai - avô - bisavô - abávio, ábavo ou trisavô - tataravô ou tetravô.

Agora precisamos entender o parentesco chamado colateral: são os irmãos, tios, primos, etc., que são parentes mas não em linha reta. Para calcular o grau de parentesco entre eles, podemos observar o que diz o art. 1594 do Código Civil de 2002: "Contam-se, na linha reta, os graus de parentesco pelo número de gerações, e, na colateral, também pelo número delas, subindo de um dos parentes até ao ascendente comum, e descendo até encontrar o outro parente."

Ou seja, se pensarmos no primo, filho do irmão do meu pai, chamado popularmente de primeiro grau, devemos subir até o ancestral comum (o avô, por exemplo), e contar o número de passos de mim até o vovô, e depois descer do vovô até meu primo. Teremos a seguinte contagem: papai - vovô - titio - meu primo. Assim, eu e meu primo somos parentes de quarto grau. Isso explica porque aquele que entendeu a regra sai por aí assustando as pessoas dizendo que perdeu todos os primos de primeiro grau: na verdade, nunca os teve.

Vale ressaltar que a lei só reconhece o parentesco colateral até quarto grau. Assim, para fins jurídicos, você não tem nada a ver com o filho de seu primo, ou o filho do primo de seu pai (popularmente chamados de primos de segundo e terceiro graus), que são, legalmente, parentes de quinto e sexto graus.

Essas regras valem para os parentes naturais. E os parentes civis?

O caso mais fácil é o da adoção: de acordo com o CC, art. 1596, os filhos adotivos e os filhos biológicos devem ser tratados da mesma forma, tendo os mesmos direitos. Assim, valem as mesmas regras acima, independentemente de o filho ser natural ou adotivo.

Quanto ao casamento, entende-se que ele cria vínculos de parentesco com relação a ascendentes, descendentes e irmãos do cônjuge ou companheiro (cf. CC art. 1594, §1) . Assim, você é parente por afinidade de seus cunhados e dos ascendentes e descendentes de seu cônjuge (o que quer dizer que pode, sim, chamar de "vovó" a mãe da sua sogra). Mas não há previsão na lei para a "dupla afinidade". Ou seja, não são parentes os concunhados, as consogras, etc.

Um último detalhe interessante sobre o parentesco por afinidade: ele se extingue entre os irmãos, mas não na linha reta com o fim do casamento ou da união estável. Ou seja, quando você se divorcia, ganha uma ex-mulher e um ex-cunhado, mas sua sogra será sempre sua sogra!

Na vida prática, já começa a ser relevante esse conhecimento: por exemplo num daqueles "concursos culturais", se o regulamento disser que não podem participar parentes até o terceiro grau de funcionários do patrocinador, e quem trabalha lá é a esposa do seu cunhado, manda bala: ela não é sua parente (é parente da sua esposa, porém).

O parentesco também interfere em pedidos de alimentos, e impedimento para o casamento (não se pode casar com ex-sogra, por exemplo, já que ela é considerada como sua parente por afinidade de primeiro grau).

Para terminar, um exercício: a imagem abaixo representa uma árvore genealógica: linhas verticais significam ascendência e linhas horizontais significam casamentos (se a imagem estiver difícil de ler, clique nela para abrir numa nova janela). Olhando a imagem, responda às perguntas:


  • Qual o grau de parentesco entre Antonio e Fábio?
  • Qual o grau de parentesco entre Helô e Ivete?
  • Cecília e Elisa são parentes por afinidade?
  • Gustavo e Fábio são parentes por afinidade?
  • Qual o grau de parentesco entre Jair e Gustavo?
  • Ao se separar de Daniel, Cecília poderia se casar com Jair?
  • E se ele também se separar de Ivete, Cecília poderia, então se casar com ele?
Divirta-se com as perguntas e responda-as nos comentários deste post para que possamos discuti-las.

Um abraço!

7 comentários (clique para comentar):

  • Mari

    1. Qual o grau de parentesco entre Antonio e Fábio?
    SOGRO-GENRO, 1 GRAU
    2. Qual o grau de parentesco entre Helô e Ivete?
    PRIMAS DE 4. GRAU
    3. Cecília e Elisa são parentes por afinidade?
    SIM, CUNHADAS, 2 GRAUS
    4. Gustavo e Fábio são parentes por afinidade?
    NÃO
    5. Qual o grau de parentesco entre Jair e Gustavo?
    NENHUM
    6. Ao se separar de Daniel, Cecília poderia se casar com Jair?
    NÃO, PORQUE JAIR É CASADO
    7. E se ele também se separar de Ivete, Cecília poderia, então se casar com ele?
    SIM

  • Alberto Lopes

    Excelente, nota 10.

    Faço um complemento: na resposta da primeira pergunta, vale lembrar que genro-sogro é uma relação por afinidade.

  • Anônimo

    Prezado Alberto,
    parabéns pela linguagem coloquial e acessível, sem perder a didática. Como a licença já está dada para todos os artigos do blog, informo que publicarei no site do meu escritório: www.andradeveloso.adv.br, obviamente com citação do Autor, respeitando os direitos pertinentes.

  • Alberto Lopes

    Milso,

    Agradeço os comentários e fico honrado com a publicação em seu site.

    Um abraço,

    Alberto

  • Marília Gil Messias (João Pessoa)

    Execelente explicação! Parabéns!

  • Celso

    Boa Tarde, tive a informação de um professor de direito civil, de 4º grau não é só o primo, mas é para não esquecermos do tio-avô e sobrinho-neto, está correta esta afirmação.Obrigado

  • Anônimo

    Por que nao:)